Skip to main content

Wilson não tem mais ninguém. Sua mulher cometeu suicídio e ele pediu demissão de seu emprego. Liza deixou uma carta, mas o protagonista não quer abri-la – pelo menos não agora.

Em busca de conforto, Wilson encontra no inusitado hábito de cheirar gasolina uma forma de “sumir”, relaxar e não ter que assumir o que o presente lhe reserva.

Ele tenta fingir que está tudo bem, demonstra uma alegria artificial, exposta em viagens e, principalmente na estranha amizade que desenvolve com Denny, um sujeito que participa de competições “infantis”, envolvendo barcos e aviões de brinquedo. O riso de Wilson não é natural, parte de alguém que gostaria de gargalhar, porém não tem forças nem para ser convincente na encenação.

A melancolia, a casa desarrumada, posteriormente vazia – roubada – e os ataques de fúria, misturados com pânico, infelizmente, ditam o cotidiano do protagonista. São esses sentimentos que o dominam e é triste constatar que os únicos meios de sair dessa terrível zona depressiva, não o levam para frente, apenas para um poço cada vez mais fundo.

Os primeiros minutos são valiosos, dizem exatamente o que precisamos saber sobre o personagem, o que ele tenta esconder e esquecer.

A fotografia, na maior parte do filme, é angustiante, tomada por tons frios, acinzentados. Sua casa, de tão escura, parece uma caverna, e não existe um lugar comum para dormir, qualquer canto é aceitável. O silêncio é absoluto, não há nada a ser dito, o espectador tem tudo o que precisa bem à sua frente – o retrato de um homem afundado em mágoas.

É interessante perceber as mudanças repentinas na tonalidade, conversando diretamente com a proposta do diretor e com as tentativas frustradas de Wilson. Espaços abertos e ensolarados cruzam o seu caminho, o que não significa que ele esteja “curado” ou mentalmente estável, pelo contrário, é uma opção narrativa inteligentíssima.

A direção de arte é precisa ao caracterizar a residência do protagonista como uma verdadeira zona, um túmulo de memórias perdidas, afinal, apesar de sofrer pelo falecimento da esposa, Wilson não diz nada muito profundo ou importante sobre ela. As fotos estão lá e salientam a sua tremenda dificuldade de olhar para frente. As paredes vermelhas são um reflexo de seu comportamento autodestrutivo e também podem ser interpretadas como os resquícios de um antigo amor. Os tons pastéis de verde têm uma clara conotação de melancolia, depressão e degradação mental.

A carta, no fim das contas, é o grande símbolo de sua vida, o que o impede de prosseguir, ainda que infeliz.

O diretor Todd Louiso não chama a atenção para si, tendo como foco principal o protagonista, expondo de uma maneira, simultaneamente, nítida e sutil sua tristeza e solidão. Para tal, ele opta por enquadramentos nos quais Wilson aparece sozinho, muitas vezes cabisbaixo, close ups intensos e planos-detalhe que revelam sintomas físicos. A baixa profundidade de campo e certos movimentos de câmera emulam brilhantemente a sensação de estar chapado. Louiso foge de sequências longas, retratando a vida do protagonista como uma série de momentos desconfortáveis, estranhos e melancólicos. Por incrível que pareça – e que denota uma certa ambição -, o diretor não está interessado em criar um drama convencional. A variação de tom – humor ácido -, a princípio, nos pega desprevenido e funciona, no entanto, com o tempo, entendemos a dinâmica da trama e a comédia perde a força.

A trilha sonora é um dos elementos primordiais para o êxito e as constantes transições do filme. As melodias variam entre o suave, a desesperança e o humor à lá Todd Solondz.

A montagem segue um padrão similar, reforçando a proposta episódica, em que nada acontece para Wilson e potencializando a comicidade, através de cortes abruptos e um timing digno de elogios. As alucinações e lembranças entram nesse pacote, inseridas em momentos oportunos.

Philip Seymour Hoffman dá vida a um homem completamente perdido. Afundando em lágrimas, mentiras e gasolina, o protagonista não encara o luto, se autodestrói física, mental e financeiramente, já que joga fora qualquer oportunidade de trabalho que surja. É fácil falar daqui e é por isso que “Love Liza” é um excelente filme. Eu não sei o que é passar por esse tipo de trauma e, de uma forma bastante original, o roteiro desenvolve um personagem fascinante, cujas escolhas são absolutamente críveis e humanas.

Seymour Hoffman oferece uma performance riquíssima, destacando todas as fases pelas quais Wilson passa. A alegria infantil, a ressaca após cheirar gasolina, os ataques de fúria, a solidão, a melancolia e a vulnerabilidade do protagonista são muito visíveis. Genial, Seymour Hoffman cria trejeitos em sua composição, como, por exemplo, as mãos trêmulas, o olhar vazio e um sorriso propositalmente forçado.

Por outro lado, a considerável lista de coadjuvantes é um tanto descartável, acrescentando pouquíssimo a trama. Kathy Bates talvez seja o melhor exemplo do mal-uso de uma atriz.

Como mencionei acima, a carta tem um papel simbólico e o desfecho, nesse sentido, é espetacular. A imagem por si, não diz muita coisa, contudo, quando entendemos o contexto, chegamos a conclusão de que não havia forma melhor de encerrar essa história.

“Love Liza” é um filme curioso, elevado pela interpretação de Philip Seymour Hoffman.

O que você achou deste conteúdo?

Média da classificação / 5. Número de votos:

Nenhum voto até agora. Seja o primeiro a avaliar!