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Durante a década de 70, Hollywood produziu alguns filmes sobre a política norte-americana. “The Candidate” é, muito provavelmente, o mais divertido. Não se trata de uma comédia escrachada ou de uma sátira.

O cineasta Michael Ritchie opta por uma abordagem realista, de estilo documental, oferecendo, ao espectador, um panorama das entranhas das campanhas políticas. O uso de câmera na mão e zoom, os cortes acentuados, a concepção dos enquadramentos e o interesse por mostrar o cenário inteiro, com ênfase para a reação do público, são artifícios que dão voz à narrativa de Ritchie. 

O roteiro não se aprofunda em seus personagens; este é um estudo de uma situação. Sem maiores piadas, apenas com um olhar naturalista afiado, rimos da verdade. É o tipo de filme que, com o passar dos anos, deveria se tornar datado. Infelizmente, não é o que acontece. As pessoas ainda tratam líderes políticos como super-heróis que desceram à terra para lhes trazer esperança. É um jogo no qual todos se mantêm disciplinados, sem espaço para movimentos bruscos. O público, intoxicado pela carência, alça crápulas aos palcos e bate palma como fantoches remendados. Sinceramente, eu não sei se tamanha humilhação e falta de autopreservação são oriundas de um desejo juvenil de fazer parte de “algo importante” ou de uma ingênua expectativa por mudanças. 

A eleição trazida pelo roteiro é para o senado da Califórnia. Crocker Jarmon, do partido Republicano, é um populista carismático que, a par da fragilidade do sistema, fez da vida pública uma carreira longínqua, pretendendo estender seu mandato por mais 18 anos. Ao longo do filme, Jarmon não diz nada que uma criança recém alfabetizada não seria capaz. Todavia, ele tem a pose, a entonação, a retórica e a confiança para ser considerado um líder nato. O povo não busca alguém com ideias; a obsessão é por uma figura quase paternal, que poderia ser vista em bares e mesas de sinuca. Jarmon se aproveita da ignorância geral, apostando em discursos pobres e inflamados para vencer. Eis que, do outro lado da corrida, surge um novato: Bill McKay, um advogado idealista, filho de um antigo governador. 

Ele não hesita em afirmar: “Eu não sei”, o que denota honestidade de sua parte. McKay tem opiniões contundentes, mas nem todas devem ser expostas. “Calma. Isso é sincero, mas não leva a lugar nenhum”. Como qualquer produto, a alma do negócio é a propaganda. Os políticos vão às ruas para serem vistos rodeados por trabalhadores, não para escutar seus anseios – o som dos flashes das câmeras é um bom sinal. Basta editar parte da fala, colocar uma narração imponente e elaborar um slogan chamativo. Qualquer ser humano minimamente educado e disposto a vender a alma pode vir a assumir um importante cargo político. É sobre decorar um discurso bonito, abotoar o paletó e mesclar firmeza e carisma. McKay, no início, urge pelo direito de falar aquilo que pensa. Isso não vende; simplesmente porque não é atraente aos olhos de quem quer ser alimentado com a mesma porcaria de sempre. No duelo entre boas intenções e boa performance, a performance sempre prevalecerá. O jogo vira quando McKay, aconselhado por seus marqueteiros, percebe que precisa vestir a máscara do político, da celebridade que está sujeita a abraços e a agressões. Mais do que isso: o protagonista chega ao patamar de Jarmon, tornando-se a personificação do candidato Democrata – o bom moço que chama a atenção por sua aparência e educação. 

A sequência em que McKay tem uma crise de riso em meio a uma fala televisiva marca a sua transformação. Assemelha-se a uma esquete do Porta dos Fundos, mas é um retrato fidedigno da política do país mais poderoso do mundo. O mesmo vale para a cena em que ele repete para si o discurso decorado, com destaque para o slogan mais genérico possível: “Um jeito melhor”. Como mencionei, Ritchie investe num realismo intenso, apresentando os bastidores de debates, comícios e coberturas jornalísticas. “The Candidate” é um filme de caráter informativo que jamais perde a capacidade de entreter o espectador, deixando, no fim, um gosto amargo, de desesperança. E depois da longa campanha? O que acontece? 

Robert Redford surge contido e, aos poucos, ganha em carisma e “malandragem”. Muita coisa passa pela cabeça do protagonista e Redford é hábil para traduzir tais questionamentos em expressões corporais, não palavras. “The Candidate” merece aplausos por seu compromisso com a autenticidade.

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