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Preso a uma vida tediosa e pacata, Jon tenta compor músicas, mas não tem talento algum. Relacionável, o personagem adoraria ser um artista, passa horas sentado em frente ao seu teclado, porém parece destinado a viver em um escritório enfadonho. O maior sintoma de sua solidão, e que conversa diretamente com a atualidade, é a sua triste necessidade de expor sua vida em redes sociais.

Graças a uma situação fortuita, Jon é chamado para substituir o tecladista de uma banda que fará um show em sua cidade. O evento é um fracasso, ainda assim, ele é convidado para se “exilar” por um período em um estúdio para gravar um disco. Seu sonho estava se concretizando, no entanto, o roteiro, gradualmente, deixa claro que este filme não é sobre Jon ou suas ambições. Os integrantes da banda cujo nome é impronunciável são, no mínimo, excêntricos. Don não superou o seu vício sexual por manequins, Clara é agressiva e Frank, o líder e gênio do grupo, usa uma gigantesca cabeça falsa. Eles não se apresentam em lugares inóspitos e vazios à toa, são figuras melancólicas, enigmáticas e introvertidas, que compõem canções para o prazer pessoal, não para o grande público, pois sabem que, além de serem “artisticamente experimentais”, não são pessoas contagiantes nem capazes de suportar a pressão de turnês. No fundo, a banda é uma fachada para a união de seres que dividem excentricidades e dores similares. Aberrações aos olhos da sociedade, eles encontram conforto e um lar em ensaios. Não há nenhum momento meloso ou especialmente delicado, todavia, é possível notar a cumplicidade entre os personagens, que conhecem as limitações e demônios alheios. Frank é um sujeito intrigante e complexo. Por que ele nunca tira a cabeça falsa? A única certeza é que o vocalista é mentalmente instável e que sua insegurança é tanta, que se sente obrigado a se esconder. O que, de certa forma, é contraditório, já que Frank é a mente criativa e inspiradora do grupo, o integrante mais amado e observado.

A princípio, pensamos que ele lidera o “culto” ou que é um pseudo artista pretensioso, mas não, o protagonista é bastante acolhedor, atencioso, reage bem a “críticas” e adora escutar composições dos colegas. Frank é simpático, sensível, razoável e bem-humorado, entretanto, não sabemos se ele sorri ou chora; se está feliz ou triste. Todos ali entendem as fragilidades do cantor e evitam perguntas embaraçosas, Jon não, o que é justo e compreensível.

Ele não faz parte do grupo, não divide as mesmas dores e traumas, não os entende e acaba os usando para a sua realização pessoal.

A música da banda é inaudível e a busca pela perfeição ressalta o pavor deles, que se sentem confortáveis naquela cabana obscura, coberta por uma imensa névoa e por tons frios. Ambicioso, Jon começa a gravar e postar os ensaios nas redes sociais, gerando uma pequena comoção na internet. Em sua cabeça, ele está libertando os novos amigos de um ambiente enclausurado e abrindo portas para a fama, justamente o que o grupo nunca quis. Frank é o único que aceita a ideia de se apresentar em um festival. Ingênuo, carente e melancólico, o protagonista quer ser amado e acredita que as milhares de visualizações significam empatia, um carinho que nunca recebeu. Jon não tem muita ideia de como as coisas funcionam no meio digital e se mostra uma pessoa egocêntrica, gananciosa e insensível, rompendo com a proposta inicial da banda – união e apoio -, partindo para um caminho cujo único desfecho plausível é a destruição.

Com o rosto coberto, Michael Fassbender oferece uma performance fenomenal, dando complexidade a Frank a partir de gestos corporais e de seu incrível alcance vocal – da firmeza ao agudo que denota fragilidade.

O protagonista já quis ser uma estrela e Jon reacende esse desejo com algoritmos mentirosos. Fassbender sai da postura enigmática, expondo uma alegria pura e inocente, no fim, demonstrando crises de pânico e uma melancolia palpável. Está tudo ali, para alguns deve ser um desafio interpretar um personagem coberto e torná-lo interessante, para Fassbender não.

As pessoas não viram os vídeos pelo conteúdo, mas pela estranheza da banda, principalmente de Frank. Os planos gerais, as paisagens vastas e ensolaradas e a multidão no Texas se contrapõem ao isolamento da floresta vazia, cercada por árvores e frieza. Não é a zona de conforto dos personagens, que abandonam o projeto, sobrando apenas o empolgado Jon e Frank. O vermelho presente no camarim salienta a ganância do personagem soberbamente vivido por Domhnall Gleeson. Avisado sobre a deterioração mental do protagonista, Jon fecha os olhos, visando somente o sucesso.

Triste em seu desenvolvimento, o filme termina em uma nota coesa e genuinamente bela. O diretor Lenny Abrahamson realiza uma incrível rima, iniciando e terminando a obra com um plano das costas de Jon, reforçando sua contínua solidão e busca por sentido. Diferentemente da abertura, no fechamento ele está em movimento, o que talvez represente o seu amadurecimento e entendimento maior sobre si e o mundo. A banda, melhor dizendo, o velho núcleo, se reúne em um espaço abandonado e se apresenta como antigamente, com vigor, paixão e integridade. A letra da música não poderia ser mais precisa: “Eu amo todos vocês “.

O distúrbio mental não advém necessariamente de famílias problemáticas, a cabeça humana prega peças impossíveis de se prever e Frank é um bom exemplo disso. A dor não traz genialidade, apenas atrasa o processo e romantizar a ideia do artista atormentado é mais uma prova de que Jon não entendia os seus colegas.

Original, peculiar e ocasionalmente engraçado, “Frank” é um grande filme.

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