“O Desprezo” é uma homenagem apaixonante ao fazer cinematográfico – sobre isso não restam dúvidas -, no entanto, também é um retrato surpreendentemente melancólico de um homem que vê no cinema a sua falência, o fim de sua razão e de seu relacionamento. Godard deixa claro: arte e realidade se misturam de uma forma necessária e desesperadora.
Paul precisa reescrever o roteiro da adaptação do clássico “Odisséia”. Ele não queria ter que se colocar no lugar de Ulisses, mas sua fala é muito nítida, seu texto se baseia em sua vida, envolvendo relacionamento, incompreensão e dor. O artista segue dessa forma, transformando o cinema, simultaneamente, em seu único amigo e pior inimigo. Camille responde a tudo rispidamente, não se alonga, nem dá justificativas para sua insatisfação. Brigitte Bardot está belíssima. Acredito que a sua nudez, apenas velada, tenha sido uma sacada de Godard para ressaltar o desprezo que a protagonista sente pelo marido. Tanto que na cena em que o nu seria mais explícito, quando Camille está a nadar no oceano, a cada braçada sua, ela se afasta mais e mais de Paul. Barreiras físicas e invisíveis são vistas constantemente. Godard utiliza portas, paredes, o oceano e barcos para separá-los.