“Mr Deeds Goes To Town” começa com uma sequência acelerada de um carro caindo em um lago, que culmina em um plano detalhe da notícia nos jornais. Um início fantástico, que mostra, com agilidade, o que precisamos saber.
Frank Capra era um mestre. Sem dúvida alguma um dos melhores diretores da antiga Hollywood. Seus filmes são gentis e otimistas. Sua facilidade em criar personagens doces, ingênuos e humanos me comove profundamente.
Longfellow Deeds é um ser raro, que talvez não exista na realidade e, mesmo assim, nos enche de esperança.
Um tio distante faleceu e deixou em seu testamento, vinte milhões de dólares. Nascido e criado na pequena, Mandrake Falls, o protagonista não conhece o mundo ao redor.
Suas impressões e princípios são calcados nas experiências locais. Deeds não se impressiona com o dinheiro, que nunca foi uma prioridade. Os advogados o forçam a ir para Nova Iorque e o que o aflige é o fato de a banda local não ter um tocador de tuba à altura.
Deeds é um poeta, um romântico, que nunca tocou em nenhuma mulher, pois tinha uma clara idealização. Ele é ingênuo no bom sentido e enxerga a maldade alheia. Nova Iorque é uma selva, onde os advogados tentam arrancar seu dinheiro, os jornalistas zombam de sua cara e todos tiram algum tipo de proveito.
Capra faz de Deeds um homem bondoso, que detém uma série de qualidades raras e as controla habilmente. Ele não tem medo de se expor, é frágil quando precisa e duro quando surge a necessidade.
Gary Cooper está sensacional. Sua composição é rica e são exatamente esses detalhes que nos emocionam. Como a forma que Deeds trata os empregados – sempre com igualdade e carinho; a voz e o sorriso contidos, que denotam tranquilidade, empatia e sensibilidade, e, claro, a honestidade com os próprios sentimentos, que antes de saírem de sua boca, ficam evidentes em seu olhar.
Há uma porção de momentos tocantes e fundamentais para a construção do personagem, merecendo destaque: a forma como Deeds desce as escadas de sua mansão, as declarações genuínas e apaixonadas para Babe e a melancolia absoluta ao saber da traição.
“Mr Deeds Goes To Town” é um filme sobre um homem honesto, que adentra um ambiente tóxico, movido pela ganância, falta de empatia e maldade.
No meio desse enredo, temos Babe Bennett, uma jornalista impiedosa, que quer um aumento e férias. Deeds é a sua grande oportunidade, então ela cai em cima dele.
O protagonista, que sempre sonhou com donzelas indefesas, se vê em uma posição privilegiada e vive o sonho. O roteiro desconstrói a personagem corrompida, com o amor puro de Deeds, que demonstra uma forte melancolia pela quantidade de ofensas desferidas pelo jornal. A trama é conhecida e o fato dela funcionar hoje em dia é impressionante. Mais do que isso, o romance aqui é belíssimo e transformador. Deeds fala sobre empatia, carinho e amor com uma ingenuidade comovente; confessa suas idealizações; se expõe; lê seu poema e sai correndo de forma destrambelhada. Ele é verdadeiro, tudo ali parece fora do comum, por isso gostamos tanto do protagonista.
Enquanto isso, Babe, que escondia sua real identidade, amolece e entende que está diante de algo importante. De repente, as matérias não faziam mais sentido e as férias nem eram necessárias. Capra une a toxicidade do meio, com a pureza absoluta e o resultado é maravilhoso. O diretor cria planos magníficos, em que os dois andam juntos por uma Nova Iorque tomada pela névoa, que eleva o romantismo e enfatiza a dificuldade em encontrar pessoas verdadeiras.
Um dos momentos mais especiais do filme, que rapidamente mencionei acima, é aquele em que Deeds descobre a verdade, o que nos leva a outro ponto importante: a desigualdade social e o valor do dinheiro. A herança claramente incomodava mais do que agradava o protagonista. Ele não era ganancioso e nunca almejou uma grande fortuna, então decide dividi-la igualmente entre futuros fazendeiros. Outra vez, a bondade se encontra com a maldade e os advogados fazem de tudo para impedir essa “desfeita”.
Eles alegam insanidade e levam o protagonista para os tribunais. A montagem aqui é fenomenal, pois consegue, através de cortes rápidos, criar uma sensação de ataque.
O final atende às expectativas e traz uma satisfação absoluta ao espectador.
No fim das contas, “Mr Deeds Goes To Town” é mais uma obra prima na carreira de Frank Capra. Gary Cooper deu vida a um dos personagens mais adoráveis e fascinantes que Hollywood já criou.
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