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Com dois minutos de projeção já é possível entender o porquê de Christopher Guest ser considerado o mestre do “Mockumentary”. A coleção de personagens é sensacional, assim como o trabalho de casting. Todos os atores escolhidos, além de excelentes, são, disparadamente, os mais apropriados para explorarem ao máximo o caráter satírico do projeto, sem cair na obviedade ou na pura caricatura. Eu detesto essas competições de cachorro. Na minha opinião, aquilo não faz sentido algum, servindo somente para humilhar os bichinhos e massagear o ego de pessoas inseguras.

“Temos tanto em comum. Amamos sopa”, diz Sherri, casada com um homem que poderia facilmente se passar por um cadáver numa peça teatral. Christy, amante de Sherri e treinadora de seu poodle, por tratar a disputa com tanta rigidez e seriedade, é digna de pena. Perder a hegemonia seria como um tiro no peito – não sei se ela seria capaz de se recuperar. De um lado, a madame que faz o “estilo” gostosona e arrumada; do outro, a treinadora “masculina” que nunca usou maquiagem na vida. Stefan Vanderhoof e Scott Donlan formam um casal homossexual que deve se divertir enquanto penteia, paparica e desfila com seu shi-tzu. O segundo, consideravelmente mais “afetado”, é o protagonista da relação; é quem faz as caras e bocas e coloca o guarda-roupa inteiro na mala, mesmo sabendo que passará apenas dois dias fora. Hamilton e Meg Swan são os primeiros a serem introduzidos. Em uma consulta psicológica, eles demonstram preocupação em relação a Beatrice, que os viu transando e, desde então, parece deprimida. Não, Beatrice não é uma criança, mas um weimaraner. Os Swan, com seus aparelhos metálicos, são um ímã de estresse banal. Talvez a cadela realmente esteja deprimida; quem não estaria com donos histericamente insuportáveis.

Harlan Pepper, interpretado pelo próprio Christopher Guest, poderia ter “solitário” escrito em sua testa. Ele gosta de pescar e adora Hubert, seu confiável bloodhound; todavia, sua verdadeira paixão é a ventriloquia, uma arte que, com todo respeito, nunca foi levada a sério. Gerry e Cookie Fleck formam o casal mais engraçado do filme. Ela já namorou centenas de homens e, invariavelmente, é abordada por um “estranho” que relembra os velhos e prazerosos tempos; ele é o clássico nerd desajeitado, um sujeito cuja insegurança é sintetizada pelo fato de ter dois pés esquerdos – isso mesmo. Eugene Levy nunca esteve melhor e Catherine O’Haara está perfeita como o “contraponto social” que, por mais pretendentes que tenha, ama seu marido. Eu não posso negar, torci por Winky, o Norwich terrier, o tempo inteiro.

Todas as raças dos cachorros refletem a personalidade de seus donos. Os figurinos e a direção de arte, a partir de decorações e quadros com cães, reforçam a adoração dos personagens pela competição e destacam a classe social de cada um. A montagem estabelece uma tensão crescente e transita perfeitamente entre os candidatos, dando a oportunidade do espectador conhecê-los sob diversas óticas. Ainda temos Theodore, presidente da competição, vivido pelo naturalmente esnobe Bob Balaban e os comentaristas. Trevor Beckwith é uma espécie de PVC do mundo canino, ou seja, um estudioso insuportável; enquanto Buck Laughlin não poderia estar se lixando mais para tudo aquilo e faz perguntas que deixam o colega sem palavras. “Na minha terra, quem usa esse tipo de roupa só pode ser porteiro”, afirma Buck, referindo-se ao saltitante Scott Donlan. No desfecho, Guest adiciona temperos ainda mais ácidos, provando ter total controle sobre a obra.

Além dos nomes já citados, destacaria Parker Posey, Jennifer Coolidge, Fred Willard e Jane Lynch – Meg, Sherri, Buck e Christy, respectivamente. “Best in Show” é uma sátira a um universo tragicômico; um universo cujos integrantes só poderiam ser apresentados num “Mockumentary” dirigido por Christopher Guest. 

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