Ed Wood

Suas ideias eram puras, seus roteiros eram verdadeiros e visavam uma investigação densa sobre os seres humanos. Pelo menos foi o que ele tentou em seu primeiro filme. O fracasso o levou a outras vertentes, sempre acompanhadas pelos fiéis – e peculiares – amigos e a sua “técnica apurada”.

Ed Wood foi o verdadeiro artista do desastre, mas havia algo dentro dele capaz de contagiar qualquer um: o otimismo cego. Portas se fecham, estúdios gargalham e, em vez de desistir, a saída é correr atrás de financiamentos quaisquer. As críticas não eram nada econômicas, porém seu foco estava no mísero elogio. Cada filme seu era taxado como o pior da história e sua única certeza era a de que o próximo seria melhor. O desfecho não poderia ser mais satisfatório. Burton valoriza o esforço e faz uma belíssima homenagem, coroando toda a paixão de Ed Wood.

Há também um encontro inesperado com um outro diretor que, além de icônico, é inspirador e significativo, pois, naquele momento, ambos conversavam em posição de igualdade, mesmo representando extremos opostos.

Essa é provavelmente a melhor interpretação da carreira de Johnny Depp. Ele captou a essência requerida por Burton e transformou o protagonista em uma figura enigmática, doce, simpática e adorável. O ator trabalha muito bem as expressões faciais, assim como os olhares e a entonação. Os baques estão sempre retornando, mas há algo dentro do protagonista que reconforta o espectador, que sabe que Ed Wood jamais desistirá. Depp nos convence e encanta ao ser o mais genuíno possível.

Do outro lado temos Bela Lugosi, um ator renomado que vive o deprimente período do esquecimento. A princípio, ele surge como um achado valioso do protagonista, que amava seus filmes do Drácula e sonhava com a presença de uma estrela de seu calibre em uma de suas produções. Porém, gradativamente, notamos que quem precisava urgentemente de alguém era Lugosi, que havia se entregue às drogas, estava entupido de dívidas e não tinha mais ninguém. As crianças batem em sua porta atrás de doces e sua fantasia não as assusta como antigamente. Sua primeira aparição é dentro de um caixão e reflete o seu estado de espírito. Eram tempos difíceis, a decadência invadiu sua vida sem permissão, esvaindo a sua autoestima. O design de produção é preciso: a casa de Lugosi é terrivelmente desorganizada e as únicas decorações são pôsteres de seus filmes antigos, denotando sua desesperadora necessidade de relembrar o passado. O roteiro pontua algo importante: os estúdios mastigam, saboreiam e depois cospem suas estrelas, sem nenhum tipo de agradecimento ou ajuda. Ed Wood não o vê assim. Para ele, Lugosi ainda era o Drácula e, por diversas vezes, a imagem projetada por Burton para o espectador é a idealizada pelo protagonista. O contra-plongée valoriza a sua imagem e coloca o ator em uma posição de imponência. A fotografia ofusca os personagens à frente de Lugosi, que é o grande foco de luz. Ele pode se esquecer das falas ou ser uma caricatura de si – Ed Wood não liga, nem percebe, sua reação ao vê-lo em cena é sempre a mesma. Seu fim foi deprimente, no entanto, seus últimos meses foram como uma justa celebração ao seu legado. Martin Landau mereceu o Oscar de ator coadjuvante. Ele faz de Lugosi uma figura imponente e frágil, que chora pelo descaso e pela solidão. Seus trejeitos são simplesmente inacreditáveis.

O elenco de apoio é enorme. Bill Murray, como um homem que deseja mudar de sexo e Patricia Arquette, como a namorada compreensiva do protagonista, são os maiores destaques.

Outro fator fundamental para o meu encantamento por “Ed Wood” é o respeito de Burton pela época em que o filme se passa. Desde a preservação da estética dos cinemas, a importância do showbiz e a presença marcante dos estúdios, até questões técnicas: a fotografia em preto e branco e o estilo de montagem muito presente naquele período.

Falando em montagem, o timing cômico é excelente. Os cortes precisos potencializam determinadas situações e os atores ajudam com reações engraçadíssimas.

“Ed Wood” é uma declaração de amor ao cinema.