Skip to main content

Hong Sang-soo, o queridinho da Berlinale, é, sem dúvidas, um dos grandes autores do cinema contemporâneo. Com apenas um minuto de projeção, já é possível identificar que se trata de uma obra sua. Dessa vez, o cineasta sul-coreano fez o seu “Entrando Numa Fria”, colocando Dong-hwa, pela primeira vez, em contato com a família de sua namorada. O tom cômico e intimidativo surge quando O-ryeong, o pai da garota, bem-humorado, se refere ao carro do genro como uma lata velha. O protagonista, por sua vez, garante que o veículo ainda funciona perfeitamente. Em outro momento, o sogro volta a cutucá-lo, reclamando da qualidade de seu cigarro.

Neung-hee, irmã caçula de Jun-hee, por todo seu brilhantismo e falta de realizações, é uma frustração para os pais. Ela gosta de colocar lenha na fogueira e, ao descobrir que o protagonista tem uma relação complicada com o pai e que se recusa a pedir dinheiro a ele, não perde a chance de provocá-lo. Ainda temos Sun-hee, a mãe, que demora a chegar em casa e, assim como Dong-hwa, é poeta. O início, quando somos introduzidos ao estilo preciso e minimalista de Sang-soo, que abusa de longos planos estáticos, focando em interações naturalistas (muitas parecem improvisadas), é excelente. O extenso diálogo entre sogro e genro, no qual a timidez inicial do protagonista, aos poucos, dá espaço a divagações sobre o seu “belo bigode”, Jun-hee e a vida, nunca perde o vigor. A bebida alcoólica ocupa um papel primordial nas narrativas de Sang-soo, sendo a poção mágica para conversas cada vez mais engraçadas e genuínas. E, sim, os atores realmente bebem em seus filmes, o que garante uma autenticidade raríssima.

Se por um lado, eu não canso de elogiar a rigidez e a confiança do diretor sul-coreano no próprio taco, por outro, neste novo projeto, ele abusa um pouco da autoindulgência, investindo em sequências intermináveis e dispensáveis. A impressão é que os atores, no ímpeto de manter o aspecto mundano de Sang-soo, falam qualquer coisa. As cenas em que o protagonista aprecia a natureza pareciam fazer parte da equação do descarte, todavia, quando chegamos ao clímax, as pontas são amarradas. Dong-hwa é um péssimo poeta e, no momento mais engraçado do filme, num estado de completa embriaguez, recita uma de suas poesias. As reações são impagáveis e Sang-soo não demonstra esforço algum para captá-las. Da mesma forma, o rosto do protagonista, ao experimentar o licor oferecido pelo chefe da casa, sintetiza o senso de humor casual do diretor. O carro velho é um reflexo de sua ideologia de gastar dinheiro somente com o necessário, o que é visto, principalmente pela mãe, como uma grande bobagem. “É bom ter muito”, diz ela, reforçando as diferenças culturais. Quanto mais alcoolizados, mais fluido, interessante e divertido o filme fica – a arte imita a vida. Claro, Neung-hee volta a comentar sobre sua relação complexa com o pai, levando-o a um estado de fúria e, depois, ao vexame completo. A “reunião” é uma verdadeira prova de fogo.

Sang-soo raramente movimenta sua câmera e seus zooms são bastante peculiares. Em determinada situação, o pai deixa o protagonista sozinho e o zoom-out passa a ideia de alívio e tranquilidade. Quando O-ryeong retorna, o zoom-in vai na contramão, conferindo intimidade e apreensão. Dito isso, o que mais chama a atenção é a fotografia, que soa desleixada. Sang-soo registra tudo com um aparato de resolução baixíssima, ancorando a narrativa no ponto de vista turvo do protagonista, que nem sempre está de óculos – além de explorar sua sensação diante da pressão e das incertezas. É uma escolha inventiva, mas que, eventualmente, cansa.

“What Does The Nature Say to You” foi o encerramento ideal para a Berlinale 75.

O que você achou deste conteúdo?

Média da classificação / 5. Número de votos:

Nenhum voto até agora. Seja o primeiro a avaliar!