Em 1967, George A. Romero estabeleceu as regras “modernas” dos filmes de zumbi. “Night Of The Living Dead” teve um orçamento baixíssimo e o seu status se deve a inventividade do diretor. Após ver seu irmão ser atacado por uma criatura estranha, Barbra se esconde numa casa, onde é protegida por Ben. A predileção por ângulos holandeses, o inteligente jogo de sombras, responsável por potencializar a impotência e o pânico, o fato dos personagens ficarem presos num ambiente pequeno e os planos-detalhe provam que Romero é um cineasta muito cuidadoso em relação à atmosfera.
Nas cenas mais intensas, ele fecha o quadro, aumentando a claustrofobia, e o design de som, somado à excelente trilha sonora, é bastante eficiente ao tornar as coisas mais enervantes. A maquiagem dos zumbis não deixa a desejar, todavia, consciente das limitações orçamentárias, Romero evita exibi-los por muito tempo. O subtexto político/social existe na medida em que Ben, um homem negro, assume a posição de protagonista – lembrando, a trama gira em torno de criaturas que atacam humanos sem qualquer motivo aparente…
Boa parte do filme se passa na tal casa, onde os sobreviventes se desentendem e pensam em formas de fugir. A presença constante das informações vindas do rádio e da televisão também ajudam na fomentação de uma atmosfera nebulosa, afinal, ninguém faz a menor ideia do que está acontecendo. O maior problema de “Night Of The Living Dead” é o foco na relação entre os personagens, que assumem a mera função de peões narrativos e são interpretados por atores fraquíssimos. Em determinado momento, eu me vi torcendo para que alguns deles fossem atacados, o que não é um bom sinal.
Romero criou as regras de um jogo que já foi banalizado, ou seja, a essa altura, em 2024, quase todos seus movimentos são identificáveis e previsíveis. Sabemos que haverá um princípio de tensão entre o protagonista e outro sujeito; sabemos que a criança adoecida se transformará em zumbi; e sabemos que, assim que eles decidirem sair para buscar ajuda, a “carnificina” se iniciará. Lembrando, ainda, que, por mais de uma hora, somos obrigados a acompanhar as interações enfadonhas entre personagens naturalmente enfadonhos.
A reação de Harry ao levar um tiro de Ben chega a ser cômica. Os atores demonstram uma tremenda inabilidade para se comportarem como seres humanos normais e o medo do ataque zumbi é pouco convincente. A falta de gore e de sequências repulsivas, devido ao baixo orçamento, é compreensível, no entanto, não posso mentir e fingir que isso também não atrapalha o resultado final. O desfecho anticlimático é brilhante, conseguindo, ao mesmo tempo, ressaltar o clima de desesperança, elevar a brutalidade e reforçar o comentário acerca das questões raciais.
A fotografia em preto e branco é essencial para colocar os personagens em contato com a sombra e a escuridão. A montagem é eficiente ao construir, gradativamente, o caos absoluto.
Clássicos sempre serão clássicos. Dito isso, nem todos envelhecem bem e o benefício da retrospectiva pode ser cruel. “Night Of The Living Dead” é um dos filmes de terror mais influentes da história do cinema, porém, boa parte de seu charme se perdeu ao longo das décadas.