Assim como Werner Herzog, as pessoas de “Encounters At The End Of The World” se desprenderam do mundano, foram atrás de respostas e testaram os próprios limites.
Talvez esse seja o seu documentário mais vistoso. As imagens subaquáticas são fascinantes, assim como as vastas geleiras, que passam tranquilidade e pureza que julgávamos ser intocáveis.
Herzog organiza o filme como um vlog de férias. Ele passa por paisagens, locais e pessoas diferentes com muita fluidez e trata tudo de maneira informal.
Mais do que uma análise territorial, esta é uma homenagem à diversidade encontrada na Antártica. São todos seres humanos interessantes, repletos de histórias extraordinárias e advindos de culturas muito específicas.
Temos um inca, com mãos enormes, que possuem linhas e detalhes únicos; uma mulher que viajou em um caminhão de lixo de Londres até Nairóbi, enfrentou guerrilheiros e a malária; um homem atordoado pelos tempos de “cortina de ferro”; um jovem banqueiro que largou tudo para entender a cultura maia e ajudá-los; e um linguista que teme pelo fim de 90% das línguas.
Os corredores opacos e as paisagens gélidas escondem esses seres e Herzog os escuta com muito carinho. Todos passaram por algo impactante, uma experiência difícil e parecem ter encontrado no silêncio da Antártica, uma fuga. Não é apenas sobre altruísmo ou vontade de ajudar o meio ambiente, também se trata de um desejo de paz interior impossível de se alcançar nos demais continentes.
A estação de McMurdo poderia estar situada em uma cidade industrial. Herzog fica impressionando com as máquinas e o barulho presentes nessa região da Antártica.
O diretor vai atrás de cientistas e se depara com um profundo encantamento. Eles amam absolutamente cada detalhe do que fazem. Uma delas consegue descrever o barulho exato das focas, o som dos passos no gelo, os ruídos do vento e até o silêncio, que permite que os batimentos cardíacos sejam escutados.
Há seres que não fazemos ideias que existem, que são extremamente violentos e deveríamos ficar felizes por eles serem minúsculos. Essa variedade de espécies e novas descobertas pode ser comparada com as diferentes pessoas que habitam aquela região. Os seres humanos estão espalhados pela superfície e sabem que são minoria. A trilha sonora evoca perfeitamente o quão espetacular e misterioso é o fundo do mar.
Herzog admira a paixão desses cientistas pelos animais e micro-organismos, no entanto, entende que estes são seres irracionais, logo, imprevisíveis.
A fala do linguista é importante, expondo a falta de cuidado que o ser humano tem consigo mesmo, enquanto árvores e focas são protegidos de forma incondicional.
A entrevista com o especialista em pinguins é primordial para a argumentação de Herzog. Ele os acompanha há dez anos e não demonstra um profundo conhecimento. O diretor segue os passos de um deles e chega a conclusão de que o caminho levaria ao suicídio. Não é um caminho pensado e é assim que os animais funcionam.
O diretor consegue captar momentos íntimos e profundos. O especialista em pinguins é um homem extremamente solitário e a paisagem ao redor reflete o seu vazio.
O que o silêncio dos mergulhadores antes de um mergulho significa? Concentração? Medo?
A celebração pela descoberta de uma nova espécie pode parecer algo banal, mas não é. É um momento de rara felicidade, à qual poucos têm acesso.
Os vulcanólogos enfrentam condições extremas, seus rostos estão congelados, mas só vemos alegria nos olhares. Sem aquilo, a vida deles não faria o menor sentido.
Herzog prova, através de entrevistas meticulosamente conduzidas, que o ser humano vive em um estado crônico de inquietude. Ele precisa ter contato com cada molécula e partícula.
A Antártica é como um espaço de descobertas e começo da vida, porém, o diretor não esconde o pessimismo com a presença humana. A pureza é extraída e o ambiente tem cada vez mais a cara daqueles que o invadiram. Herzog dá ênfase para essa transformação, sempre com falas diretas e incisivas. As imagens não mentem. Para Herzog, “nossa conquista” se resumirá a um peixe congelado e a uma foto de um passado muito distante.
“Encounters At The End Of The World” é um retrato poético sobre diversidade, pessoas apaixonadas pelo que fazem e a Antártica.
Um filme capaz de te encantar e preocupar com a mesma intensidade.
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