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A imagem do casal apaixonado no mar, ao som de uma bela trilha sonora, é impactante. Os olhares são mais expressivos que as palavras, denotando carinho e preocupação. Essa estabilidade desmorona quando um terceiro elemento reaparece e fecha o triângulo.

Jean era um bom jogador de rugby, porém foi preso e teve sua carreira abreviada. Seu filho, Marcus, vive com a avó e tem dificuldade em crer na própria individualidade. Jean tenta ensiná-lo sobre a importância das escolhas; o futuro não foi pré-definido de acordo com origem ou cor de pele, as coisas devem ser conquistadas. Marcus está confuso, talvez trilhe o infeliz caminho do pai.

Sara tem tudo: um marido, uma bela casa e um emprego fixo. A felicidade em seu rosto parece genuína.

As pessoas querem manter impressões, prezam por aquilo que é previsível e palpável. Jean foi condenado, perdeu o que julgava ser fundamental e quer ter uma vida normal, igual a dos outros. Sara viveu um grande romance no passado e não sabe se o superou. Sua única certeza é que o presente não é estimulante como o passado.

Os espaços abertos e fechados formam um interessante contraste – leveza e tensão. François volta a Paris e as melodias ganham em sugestão. Ele oferece um emprego na sua agência esportiva a Jean, que enxerga na proposta a oportunidade de se aproximar ainda mais da sociedade. Claire Denis é fascinada por rostos humanos e os olhares apaixonados passam a indicar desconfiança e medo. François é um fantasma, sua presença não precisa ser física para abalar um relacionamento.

Sara embarcou na ideia de perfeição, apesar de nunca ter acreditado nela. A protagonista não esperava rever a antiga paixão; seu coração gostou da surpresa, seu cérebro, não. Em determinado momento, a janela da varanda separa o casal, cada vez mais nervoso e incapaz de lidar com a inusitada situação. Os diálogos perdem em fluidez, as falas ficam aceleradas, como se eles estivessem sempre se justificando perante um júri.

François enche Jean de tarefas, puxando Sara para a década passada, quando se amaram despreocupadamente. O aguardado reencontro demora a acontecer e a câmera lenta ressalta o impacto daquele instante para a protagonista, que se vê diante de um teste de fidelidade e honestidade. Jean não aceitou o emprego apenas para alimentar uma imagem pré-concebida, mas para ter certeza de que dormia ao lado de sua esposa, não de uma uma mulher em busca de um substituto.

Os rostos de François e Sara ficam colados. Há um misto de desejo e amor ali, evidenciado na feição radiante da protagonista. Ela fica bastante tempo na cama, não se sente amada pelo marido, alheio e distante desde que entrou para a agência do “rival”. Laços frágeis são desamarrados sem muito esforço e o grande mérito de Denis é compreender a essência humana. Seus personagens estão por aí, em algum apartamento, escondendo algo, fingindo que está tudo bem.

O uso gradual de câmera na mão, chegando ao ápice no terço final, é perfeito ao emular o comportamento físico e mental do casal, tomado pelas mais diversas emoções.

“É triste. Não estamos juntos”. Por que Sara não pede o divórcio então? Nada é simples. A aparência sóbria é mantida até que Jean feche a porta. Temos acesso às suas verdades, o que torna seu show de encenação e mentiras mais nojento. É contraditório, pois, de alguma forma, suas reações também são relacionáveis. Jean anda de um lado para o outro, está sempre ansioso e inquieto, tendo que lidar com diferentes questões.

Não existem heróis e vilões, como espectadores, apreciamos uma dinâmica absolutamente visceral. As relações não sobrevivem na presença de fantasmas, apodrecem na medida em que o pedregulho no sapato se transforma numa rocha.

Denis, com sua câmera empática e crua, dá espaço para Juliette Binoche e Vincent Lindon elaborarem performances complexas. São as nuances criadas no início que validam a explosão final. Conhecemos aquelas pessoas, elas se seguraram o máximo possível. Nesses casos, o ideal é deletar tudo…

Em 2022, Claire Denis dirigiu dois filmes: “Stars At Noon” e “Both Sides Of The Blade”, sendo que este, apesar de ter alguns problemas em seu ritmo, é consideravelmente superior ao outro.

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