Vida Selvagem

Os supostos heróis não são tão seguros assim e cometem mais erros do que imaginávamos. Joe enxergava nos pais o equilíbrio e passou a vê-los como seres humanos, que se frustram e agem impulsivamente. Jeanette se sente solitária, passa a olhar mais para si e esquece que tem um filho para cuidar. Ela se veste como uma jovem em busca de diversão, bebe demais, esnoba a própria vida e leva Joe para jantar com o possível substituto de seu pai. Olhando de fora, conseguimos criar algum tipo de empatia pela personagem, afinal, ela foi abandonada pelo marido, mora em uma cidade que não conhece e precisa achar uma forma de manter a casa em ordem. Jeanette está cheia de rancor e muda de personalidade. O carinho maternal dá lugar a uma desconfortável honestidade, que rompe com a imagem idealizada pelo filho. Ele é o protagonista da história. Podemos entender o lado de Jeanette, contudo, somos contagiados pelo ponto de vista de Joe, que encontra graves defeitos naquilo que julgava ser puro e intocável: o amor de seus pais.

A direção do estreante Paul Dano é impressionante. Sua câmera se movimenta em relação ao protagonista, muitas vezes sugerindo algo, que, no entanto, somente será explicitado ao espectador, após ser descoberto por Joe. Há algumas cenas envolvendo discussões e Dano sempre escolhe o rosto correto para admirar e extrair a reação mais genuína possível. Ele adora brincar com pontos de vista, colocando a câmera em lugares surpreendentes e dando conotações distintas a sequências supostamente simples.

A fotografia utiliza uma paleta monocromática para salientar a melancolia e o clima de incerteza.

Joe estava acostumado com o futebol americano e jantares em família e, repentinamente, precisava se impor e simplesmente não sabia como. Ele gostaria de dizer para a mãe que seu pai ainda a amava. O roteiro é preciso ao trazer o tipo de coisa que um garoto daquela idade diria. Joe solta indiretas, mas sua força está na interpretação de Ed Oxenbould, que, através de reações expressivas demonstra medo, impotência e insegurança.

Há um momento muito sutil em que o protagonista assiste um programa de TV, no qual os personagens formam uma família feliz. Ali está a idealização, o sonho e a dificuldade de se expressar.

Jerry volta e, ingenuamente, acredita que tudo vai se acertar. Ele é agressivo e imaturo na frente de Joe, que corre sem ter mais certeza de absolutamente nada. A última discussão entre Jeanette e Jerry é intensa e realista, graças aos atores, que encarnam adultos perdidos com muita honestidade.

No fim, podemos dizer que Joe parece mais maduro e entende que seus pais são falhos como qualquer ser humano. Ele não precisa dizer, a sua feição denota tranquilidade e compreensão. O último plano reflete o efeito da obra de um modo geral.

Carey Mulligan interpreta uma personagem angustiada e claustrofóbica. Seu amor pelo marido e pelo filho não está em questão, porém, a previsibilidade imposta pelo casamento a travou e quando a ponta do iceberg estourou, ela perdeu a noção de suas funções básicas. Mulligan é sempre uma presença marcante. A atriz faz muito com a entonação e o seu trabalho corporal também merece elogios.

Jake Gylenhall tem menos tempo de tela, mas sua atuação é igualmente poderosa. Ele mantém no personagem uma certa sobriedade, tornando os seus momentos de explosão raros e genuínos.

“Wildlife” é um excelente drama, dirigido por um dos grandes atores da atualidade.