Após se formar, Willie retorna à sua cidade natal. Na estação de trem, ele não encontra seu pai, que, após anos sem vê-lo, esperava por um jovem forte e alto. William, mais conhecido como Steamboat Bill, é um marinheiro, recentemente rebaixado a um posto menor devido a chegada de King, seu rival, um homem muito mais rico, dono de um enorme navio.
Eles se odeiam e o fato de estar passando por uma fase complicada acaba influenciando na sua relação com o filho, que não poderia ser mais diferente do que o que sua mente idealizava.
Para piorar, o protagonista e Kitty, filha de King, já se conhecem e rapidamente se apaixonam, enfurecendo os oponentes, que não querem nenhum tipo de contato. Nesse sentido, ainda que não admitam, eles concordam.
William quer transformar seu filho em um marinheiro típico e detona o seu visual, a começar pela boina, que por circunstâncias engraçadíssimas, sempre retorna.
Willie não é turrão como o pai, é sensível, urbano e frágil. Ele mal consegue andar no barco sem tropeçar em uma corda ou bater o rosto nos mastros. Sua roupa, embora lembre a de um marinheiro de alta patente, acaba ofendendo William, um operário orgulhoso.
O protagonista e Kitty combinam de se encontrar escondidos. Em uma das cenas mais engraçadas do filme, Willie tira calmamente o pijama, coloca uma roupa e se deita ao perceber o movimento do pai, que nota algo estranho, mas não entende a situação por inteiro. Ele foge, porém não chega até Kitty e enfurece o pai, que decide mandá-lo de volta para casa. Todos ficam contra o pobre Willie. O terceiro ato chega e as coisas mudam. Buster tinha uma facilidade impressionante para criar enormes sequências, repletas de gags e acrobacias elaboradas e, sinceramente, não sei se algum outro filme chega perto do que ele fez em “Steamboat Bill, Jr.”
O garoto sensível e ingênuo vira um herói, primeiro por libertar o pai da cadeia, mas, principalmente, por salvar todos os personagens de uma das tempestades mais fascinantes já vistas. Os cenários desmoronam, o vento carrega telhados e carros e Willie voa em uma árvore. O protagonista não perde sua essência, no entanto, deixa de lado sua inocência de recém-formado para se tornar o herói que aquelas pessoas precisavam, chegando a unir inimigos eternos. Na cena mais icônica do filme, Willie está em frente a uma casa que despenca. Ao longo de sua carreira, Buster impressionou pela coragem, pelo timing, pela capacidade atlética e pela expressividade. Todos esses elementos estão em “Steamboat Bill, Jr.” e são encapsulados nessa cena, na qual o ator se posiciona milimetricamente na direção da janela, caso contrário, poderia morrer ou se lesionar gravemente.
Que ator é capaz de realizar gags tão sofisticadas e efetivas assim? Willie derruba três capangas, todavia, sabe que não é capaz de derrotar o outro, então se taca no mar. É simples, porém com a expressão correta e o timing perfeito, Buster faz tudo parecer complexo e inovador.
O soco que ele dá no guarda e a extrema dificuldade que tem para simplesmente passar por cima dele são hilários.
A forma como o protagonista tenta avisar ao pai que colocou ferramentas dentro do pão é uma aula de interpretação, de como cadenciar seus movimentos e mudar rapidamente de feição.
Além de acrobático, destemido, genuinamente engraçado e perfeito ao controlar o ritmo de cada cena, Buster construiu uma persona simplesmente encantadora. Humilde, sensível e ingênuo, o rapaz amadurece ao longo do filme e transmite os seus valores aos demais, resultando numa união não só entre familiares, mas entre todos os envolvidos.
A sequência que melhor explora o amor do pai pelo filho é aquela em que Willie é espancado pelo guarda e não vemos a ação, somente a reação de William, que sofre.
Iniciando o filme com uma panorâmica e planos gerais que apresentam a paisagem para o espectador, Buster demonstra domínio perante a linguagem cinematográfica. Percebam que, em uma das raras cenas em que os rivais estão juntos, o diretor admite a posição social de cada um, colocando King “acima” de William. Isso também é refletido nos figurinos e na diferença entre os barcos.
Seu uso recorrente de planos-detalhe é interessante, não só por informar o espectador, mas por ser uma outra forma sutil de humor – similaridade.
Keaton constrói o terreno nos primeiros atos para, literalmente, jogar tudo para cima no último, criando uma rima interessante entre o desastre e a harmonia.
“Steamboat Bill, Jr.” é uma das obras primas mais importantes do cinema mudo.