Poucos filmes são tão elegantes quanto “Sabrina”. Todas as escolhas, desde a delicada trilha sonora até os figurinos e a luxuosa mansão remetem a algo extremamente prazeroso.
“Sabrina” é uma obra deliciosa, carregada pela sensibilidade de um grande mestre e um trio absolutamente fenomenal de atores.
David Larrabee é um jovem imaturo, que não dá importância para os negócios da família, apenas para mulheres, que são trocadas como meros objetos.
Seu irmão, Linus, é o oposto. Um homem sério e frio, que parece ter escolhido a solidão, a fim de focar nos negócios.
A dinâmica entre os dois é interessante, pois existe o carinho comum entre irmãos e as várias discordâncias entre dois adultos que enxergam o mundo de formas distintas.
Sabrina é a filha do chofer. Ela sempre foi apaixonada por David, que nunca lhe dedicou a mínima atenção. O que era uma brincadeira, se tornou um amor dolorido, cujo “fim” a levou ao primeiro encontro com Linus, que é fundamental para o desfecho do filme.
Ela viaja para Paris para aprender a cozinhar, contudo, o real intuito é esquecer David.
Sabrina retorna e chama a atenção das pessoas com suas roupas elegantes e presença marcante. Todos a reconhecem, menos David, que pela primeira vez a olhava de forma mais penetrante. Ele rapidamente se apaixona, enfurencendo seu pai e Linus, que contavam com seu casamento com Elizabeth Tyson para selar um negócio importante.
Cabe ao irmão mais velho a missão de separar os dois.
Logo de cara, o que fica nítido em “Sabrina” é a distância entre os ricos e os pobres. O pai da protagonista é um homem lúcido e pouco ambicioso, resignado com o “seu lugar” na sociedade, que se preocupa com os avanços da filha.
Billy Wilder utiliza árvores e janelas para potencializar esse distanciamento. Sabrina está sempre se esgueirando, ela não pode simplesmente aparecer, pois não pertence àquela realidade.
A montagem usa imagens sobrepostas para criar um efeito onírico e melancólico.
Quando a protagonista retorna e é convidada pela primeira vez para uma festa dos Larrabee – na sua mente, o mais próximo do céu -, temos um exemplo nítido do “efeito Audrey Hepburn”. Somente ela seria capaz de romper com o status social e chamar atenção de todos os homens. Sua roupa remete a de um anjo e Wilder a apresenta como uma figura única e especial.
Sonhadora do jeito que é, Sabrina é facilmente enganada por Linus, cuja presença, inicialmente desconfortante, se torna acolhedora.
Os atores tem uma química fascinante e é Humphrey Bogart – o rei do filme Noir – quem tem o maior desafio e vive o arco mais significativo. Linus surge como uma figura intimidadora e gelada que despreza certos sentimentos. Gradativamente, percebemos que aquela é apenas uma máscara, que o priva de fantasmas do passado e envolvimentos profundos. Os negócios acabaram sendo uma saída fácil para dores e dilemas humanos e reforçaram sua persona rígida.
O plano era simples: enviar Sabrina para Paris e se livrar dela, porém…
Wilder cria momentos genuinamente doces e belos como o passeio de barco e a dança, e, a partir deles subverte Linus, que sorri discretamente. O grande mérito de Bogart é deixar claro quando a armação se transforma em amor. Seus olhares e reações são específicos e fundamentais para o arco do personagem. No fundo, Linus era apenas um homem que havia admitido a solidão e tinha se esquecido da beleza do universo quando se tem alguém. Os negócios deixam de ter o mesmo valor e uma viagem repentina para Paris parece a melhor escolha. Ninguém o conhecia inteiramente.
Sabrina, que vivia escondida entre as árvores, tocou o coração dos dois irmãos. A cena em que Hepburn se movimenta na quadra de tênis é de uma doçura rara, entretanto, seu grande momento é quando beija David e percebe que não o ama mais.
A bela fotografia em preto e branco é parte fundamental para o charme do filme.
O design de produção, além de elegante, ratifica o poder dos Larrabee.
Assim como o contra-plongée utilizado por Wilder para expor a magnitude do prédio empresarial da família.
A transição de Sabrina é evidenciada através de seu figurino, que muda completamente após a sua ida a Paris.
O roteiro é capaz de desenvolver excelentes personagens e diálogos incríveis, que ditam o ritmo da trama com boas tiradas cômicas.
“Sabrina” é uma obra fascinante em todos os níveis.
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