Em 1982, Walter Hill dirigiu “48 Horas”, um dos grandes exemplares do “buddy cop”. Hill é um cineasta que lida bem com ação e roteiros calcados em interações constantes. Filmes como “The Warriors” e “Ruas de Fogo” reforçam o seu lado “esteta” e a capacidade imaginativa para incorporar características de mídias visuais diferentes ao cinema. Digo isso, para ressaltar que, para Hill, dirigir “Red Heat” não foi um desafio – ele estava em sua zona de conforto e operou como manda o manual.
O início, na União Soviética, serve para destacar o contraste que será o fio condutor da narrativa. Ivan Danko, oficial militar, enfrenta traficantes numa sauna e, depois, na neve. Os russos são frios e calculistas; seus uniformes são mantos do orgulho patriótico e as construções que os cercam, palácios da opressão. Viktor Rostavilli, chefe do tráfico, mata o colega de Danko e foge para os Estados Unidos. Chicago, com suas ruas sujas e letreiros em neon, é um antro da selvageria. O estrategismo russo, guiado por interações monocórdicas, é substituído pelo carisma urbano americano. Art Ridzik, policial local, compensa os rastros de sangue com eficiência. Na busca por Viktor, ele será o parceiro de Danko.
Como eu mencionei acima, “Red Heat” não tem grandes pretensões; seu único objetivo é divertir o espectador. É o tipo de projeto autoconsciente da década de oitenta que reconhece suas limitações e foca em seus pontos fortes. A trama é um mero veículo para o que realmente importa e as sequências de ação, sendo muito sincero, são completamente esquecíveis. Como todo grande “buddy cop”, o foco está na dinâmica entre os personagens centrais e, nesse sentido, o filme se sai muitíssimo bem. A ideia é nítida: ponha atores com características distintas, que representam espectros políticos opostos e “torça” para que haja química entre eles. E, sim, Jim Belushi e Arnold Schwarzenegger apresentam uma química formidável – a quantidade de diálogos cativantes é impressionante.
— É o meu relógio. Está na hora de Moscou.
— Hora de pegar a namorada?
— Hora de alimentar o periquito.
— O que é isso? Punheta em russo?
Sabemos que, a princípio, haverá um desentendimento e que, com o tempo, os dois se tornarão amigos. Os bons filmes deste gênero são aqueles em que as interações soam orgânicas, sem truques baratos para facilitar a aproximação. “Red Heat” não força situações mirabolantes nem dispara piadas desnecessárias; pelo contrário, o roteiro entende as características essenciais de seus personagens e as coloca em jogo – parece simples, mas demanda um certo nível de expertise para ser tão bem executado. Schwarzenegger quase sempre escolhe papéis perfeitos para si, reconhecendo suas limitações. Seu carisma canastrão é apropriado para Danko, um militar que nunca muda de expressão, tem o físico de um tanque de guerra e gosta de soltar algumas espetadas engraçadas. Belushi, por sua vez, nos brinda com seu timing cômico impecável e charme cafajeste, provando ser o ator ideal para contracenar com o austríaco – são espectros opostos da arte da interpretação, o que, de certa forma, dialoga com a obra. “Desisto. Isso é tudo muito russo”.
“Red Heat” é o tipo de entretenimento que faz falta nos dias atuais.



