Existem algumas razões para que os melhores filmes esportivos tenham sido realizados nos Estados Unidos. Hollywood elaborou uma fórmula mágica que, quando bem incrementada, torna-se infalível. Esqueçam qualquer complexidade; somos capazes de prever quase tudo que acontecerá em “Major League” e, ainda assim, não deixamos de sorrir ou de torcer pelos personagens por um minuto sequer. Por que? Porque o ser humano gosta de se espelhar em situações adversas e de torcer pelo imaginável (os famosos “underdogs”).
Filmes como “Major League”, além de brilhantemente concebidos, despertam uma sensação muito agradável e positiva no espectador que, diante dos percalços cotidianos, se depara com figuras divertidas e de fácil identificação. Há um outro fator que, de certa forma, “facilita” o sucesso de obras que retratam esportes americanos; afinal, eles são os mais “cinematográficos” possíveis.
Após a morte do dono do Cleveland Indians, Rachel, sua viúva, uma sub-celebridade, o assume com a intenção de transferi-lo para Miami. Para isso, o time precisa ficar em último e atrair cada vez menos torcedores. Rachel, então, contrata uma série de desconhecidos e veteranos, montando um elenco de figuras peculiares. O Cleveland Indians é uma espécie de Vasco do beisebol; ou seja, tem alguma tradição, mas não é levado a sério há muito tempo. Desde o início, fica nítido que este é um projeto de paixão do cineasta David S. Ward, um amante de esportes. Ele trabalha os clichês com inteligência, escorando-se num elenco talentosíssimo e que compõe personagens que não demoram a ganhar a simpatia do espectador. Rick Vaughn é um jovem marginal cuja principal característica é a potência dos lançamentos sem direção. Posteriormente, descobrimos que Rick precisa de óculos, o que justifica sua dificuldade em mirar no alvo certo. Pedro Cerrano rebate bolas retas como ninguém; todavia, quando elas são lançadas com efeito, ele é incapaz de acertá-las. Willie Mays Hayes corre na velocidade da luz, mas, ao segurar o taco, demonstra uma constrangedora inabilidade. Roger Dorn é o típico “coroa” decadente que se considera um astro intocável, mas que, na realidade, mal consegue dobrar os joelhos. Jake Taylor já foi um grande jogador, no entanto, a idade chegou e ele foi incapaz de dar um passo adiante e amadurecer, o que resultou no afastamento de Lynn, o amor de sua vida, que está prestes a se casar com um sujeito que, apesar de pacato, lhe garante uma estabilidade. Não poderia esquecer do técnico Lou Brown, o René Simões americano.
Existem desavenças entre alguns colegas, importantes para o desenvolvimento da trama e para o impacto do “Grand finale”. Cerrano é adepto de rituais vodus, com direito a oferendas a Jobu, seu guia espiritual; Harris, em contrapartida, é um católico tradicional. Dorn, o veterano espertão, gosta de pegar no pé de Vaughn, que não leva desaforo para casa. O esporte fica em segundo plano; o foco principal está nos personagens e nas relações estabelecidas pelo roteiro. Lynn já foi atleta olímpica, mas aderiu ao intelectualismo. Ela cansou da infantilidade de Jake, um homem que admite os erros do passado e que luta para dar a volta por cima. “Sou só um cara querendo endireitar a vida”. Ele é o protagonista, o que é reforçado por Ward na cena em que Brown informa aos atletas o plano de Rachel. A montagem e a trilha sonora estabelecem um dinamismo considerável às sequências esportivas, como, por exemplo, as dos primeiros treinos, nas quais as “habilidades” dos personagens são esclarecidas, e aquelas que pontuam a ascensão do time, arquitetando uma conexão forte com os fãs, que retornam ao estádio e vestem camisas estilizadas. Ward compreende que o esporte é capaz de elevar a moral de uma cidade inteira e é hábil ao inserir o espectador naquela realidade, seja ele ou não fã de beisebol. O esporte, com seu efeito restaurador, transforma seres como Vaughn, um meliante “descartado” pela sociedade, em ídolos.
No clímax, Ward, a partir do uso preciso de câmera lenta, contra-plongées e de planos que contemplam a dimensão da torcida, confere um tom épico e merece elogios por dar um momento glorioso a cada personagem, ressaltando o espírito de equipe que foi conquistado. Claro, nada disso seria possível sem as performances marcantes de Tom Berenger, Charlie Sheen, Wesley Snipes, Rene Russo, Corbin Bernsen e James Gammon. Ward sabe que depende do carisma e da vitalidade de seus intérpretes, então os abraça, como um grande técnico.
“Major League” é um dos melhores filmes esportivos já realizados.