“Heathers” pinta um retrato irônico e provocativo da realidade escolar. Os personagens são símbolos, caricaturas que ocupam seu espaço num meio definido pela segregação. A falta de personalidade geral é sintetizada no trio das “populares”. Todas se chamam Heather, sendo as cores que vestem o único ponto de diferenciação. Veronica também faz parte do grupo; não por admirá-las, mas por entender que há de se fazer certos sacrifícios a fim de sobreviver ao ensino médio.
Cansada da futilidade e das brincadeiras cruéis das “amigas”, a protagonista se junta a Jason Dean, que, nesse universo ícones, é quem demonstra ser mais autêntico. Com seu sobretudo e sua moto, ele é uma mistura de matador de aluguel, “herói” Western e rebelde sem causa. A dupla decide dar uma lição na líder das populares, porém, o plano sai do controle, acarretando a sua morte. A comunidade entende aquilo como um suicídio e a carta escrita por Veronica, que é capaz de imitar a caligrafia de qualquer pessoa, imortaliza Heather, agora, a jovem incompreendida.
Jason convence a namorada a se vingar de uns jogadores de futebol americano que espalharam histórias falsas a seu respeito, o que resulta em outros dois assassinatos, também arquitetados para que as pessoas pensem que os “machões” que não conseguiram sair do armário se suicidaram. O roteiro tem intenções cômicas e é inteligente ao retratar a escola da forma mais artificial e ardilosa possível. Os adolescentes ali são tão inseguros, que a onda de “suicídios” é vista como uma saída aceitável por aqueles que não suportam mais o fato de vestirem uma máscara diariamente ou de nunca terem entrado em contato consigo. As mortes despertam o vazio de seres naturalmente vazios. Os policiais são preguiçosos, os professores são idiotas e os pais são condescendentes. Ninguém investiga os casos a fundo, pois a sociedade adora o caos e o horror. Existe uma certa atração em ligar a televisão e se deparar com notícias desse tipo. Os educadores gostam dos holofotes e os pais estão mais interessados se os filhos apareceram na matéria do jornal, do que na possibilidade deles serem as próximas vítimas.
Jason fala sobre limpar o ambiente, torná-lo tolerável, todavia, gradativamente, notamos que ele não está nem aí para nada e que só quer pôr em prática os seus desejos sanguinolentos. Veronica rejeita a possibilidade de ser a parceira de um psicopata, então se afasta e pensa em maneiras de impedir tragédias ainda maiores. Os trabalhos de direção de arte, figurino e fotografia são excepcionais. Os personagens não são caracterizadas por anseios, mas pelas cores que as perseguem. As Heathers se dividem entre a de vermelho, a de verde e a de amarelo. Veronica é associada ao azul. Jason, além de se comportar e de se vestir como um verdadeiro mensageiro da morte, surge, por vezes, junto a uma camada de fumaça, que ressalta as suas intenções macabras.
O vermelho é a marca da maldade; está nas decorações, nos figurinos, no sangue e na iluminação vibrante, que contrasta com o frio e igualmente chamativo tom azulado, cujas funções são de conferir um aspecto melancólico e de reforçar a presença cada vez maior da protagonista. No clímax, as cores traduzem o embate e o inteligente uso de montagem paralela potencializa a tensão.
Apesar de tais méritos, “Heathers” não é perfeito. A caricatura, eventualmente, se torna cansativa e desinteressante. A sequência onírica, por exemplo, pouco acrescenta à narrativa, revelando apenas um certo exibicionismo do cineasta Michael Lehmann.
Winona Ryder está excelente no papel central, no entanto, o grande destaque é Christian Slater, que encarna um personagem cool e detestável com o carisma apropriado – eu não tenho dúvidas de que ele se divertiu bastante durante as gravações.
“Heathers” é ambicioso e perspicaz em seus apontamentos.