Carlos Reichenbach foi um dos nomes mais autênticos e provocadores da história do cinema brasileiro. Enquanto muitos buscavam reconhecimento institucional, ele construiu um legado à margem, com filmes marcados por liberdade estética, pulsão política e humanidade radical.
Reichenbach surgiu no calor da Boca do Lixo nos anos 1970, um território onde o cinema popular, o erotismo e a crítica social conviviam em obras de baixo orçamento e criatividade explosiva. Foi nesse caldeirão que ele encontrou sua voz, transitando entre o melodrama, a pornochanchada e o cinema de autor com naturalidade e profundidade únicas.
Seus filmes nunca foram fáceis. “Filme Demência”, “Alma Corsária” e “Garotas do ABC” são apenas alguns exemplos de uma obra que questiona o moralismo, exibe a beleza dos corpos fora do padrão e revela o Brasil que insiste em ser ignorado. As mulheres de Reichenbach não são coadjuvantes: são protagonistas complexas e intensas, reflexo de seu compromisso com o real.
Mesmo sendo um dos cineastas mais inventivos e sensíveis de sua geração, Carlos enfrentou censura, desprezo crítico e orçamentos mínimos. Mas nunca perdeu o entusiasmo, a generosidade com seus colegas e o desejo de filmar. Era um verdadeiro cinéfilo — daqueles que frequentam sessões de rua, discutem Godard e Glauber Rocha com a mesma paixão, e defendem o poder transformador do cinema.
Seu último longa, “Falsa Loura” (2007), sintetiza sua obra: uma mistura de romance, desencanto e resistência. Um cinema que não teme o excesso, nem a fragilidade.
Carlos Reichenbach faleceu em 2012, no dia do seu aniversário, deixando uma filmografia visceral e afetiva. Para quem ama o cinema brasileiro, revisitá-lo é um ato de justiça e celebração.