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“Matinee” é um filme surpreendentemente ambicioso, que fala um pouco sobre a evolução da experiência nas salas de cinema e apresenta um panorama do povo americano, em pânico com uma possível guerra nuclear. Na década de 50, com o advento da televisão, ficou cada vez mais difícil tirar as pessoas do conforto de suas casas. O que a grande tela poderia oferecer ao espectador? O 3D, ainda embrionário, foi uma tentativa, assim como o aumento da razão de aspecto e o odorama, que era uma cartela com fragrâncias variadas. Em “Matinee”, Lawrence Woolsey, “o mestre do horror”, tem Cuba e os mísseis soviéticos como principais rivais. Seu novo filme, “Mant”, é sobre um homem que se transforma numa formiga após uma explosão nuclear.

As pessoas passam os dias com os ouvidos presos à rádio e os olhos, à televisão. As ruas estão caóticas e o supermercado é o palco de brigas pelos últimos produtos. O medo real as consumiu e Woolsey sabe que terá que ser criativo para apavorar seus fãs. A formiga gigante, sozinha, não é páreo para o fim do mundo. O marketing, do trailer tendencioso aos cartazes mirabolantes, é a prova de que estamos diante de um homem da indústria. As cadeiras vão chacoalhar durante a sessão, o teatro pode dar uma leve tremida, a tela deve ter um curto-circuito e, claro, haverá um sujeito fantasiado de “Mant” circulando pelas fileiras. Joe Dante demonstra ser um verdadeiro apaixonado pela magia de ir ao cinema, destacando os preparativos e as ações que precedem o apagar das luzes.

Gene e Dennis, o irmão caçula, assistem a todos os filmes de monstros. O primogênito reconhece sua posição; cuida, acolhe e assusta Dennis em medidas proporcionais. As constantes realocações do pai, um militar, comprometem a infância de Gene, que não consegue estabelecer amizades. A onda de histeria o aproxima dos novos colegas de escola, que perguntam sobre novidades na base. Stan, seu novo melhor amigo, só pensa em garotas, especialmente em Sherry, que é introduzida como um anjo que desceu para abalar corações. A situação não é tão simples, já que Harvey, o antigo namorado de Sherry, além de mais velho, é um marginal com a ficha suja. Gene, por sua vez, se encanta por Sandra, que, numa simulação de um ataque nuclear, expõe sua posição política.

-O que fizeram com você?

-Suspensão. Por uma semana.

-Puxa!

-Baniram Gandhi por um ano.

-Não conheço muita gente por aqui.

Alguns pais fazem campanha para que “Mant” não seja exibido, afirmando que a mensagem passada pelo filme não é saudável. A caricatura se confunde com a pessoa real, fazendo de “Matinee” uma obra divertida e doce. As interpretações ficam nesse limiar e o trabalho de reconstituição de época é impecável. Os figurinos também são marcas muito expressivas daquele período e servem à caracterização dos personagens. O vestido rosa de Sherry e a jaqueta de couro de Harvey não poderiam ser mais apropriados. Tudo é orquestrado para que todos se reúnam na sessão de estreia. As traquinagens de Woolsey funcionam até certo ponto e as coisas saem do controle. A possível guerra e o filme ganham contornos simbióticos. Quando o espetáculo termina, as pessoas saem e se deparam com o céu aberto. O cinema é a arte das reações viscerais e a experiência coletiva é inigualável. O “Mant” fantasiado acaba ficando tão furioso quanto o da tela (sem maiores detalhes) – esse toque metalinguístico é delicioso.

John Goodman está excelente na pele do diretor picareta e simpático. Sua presença é sempre notável e Woolsey gosta de ser o centro das atenções. Cathy Moriarty é o contraponto perfeito, exibindo descaso e ceticismo com uma acidez engraçadíssima. Os dois formam uma dupla que combina com o tom peculiar idealizado por Dante.

“Matinee” é um “coming of age”, um retrato histórico, uma carta de amor à sétima arte… e, acima dos inúmeros rótulos, é um grande filme.

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