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Peter Appleton é um roteirista de filmes B na década de 50, o momento mais glorioso de Hollywood. O plano sequência que apresenta as pessoas entrando no exuberante cinema, além de elegante, confere a correta conotação ao melhor entretenimento existente. A multidão se arruma, sai de sua casa, compra um ingresso e divide um espaço de sonhos, possibilidades e autoconhecimento. O protagonista almeja voos maiores na indústria, todavia, repentinamente, é visto como persona non grata. Seu nome apareceu na lista negra dos comunistas, obrigando-o a repensar sua vida. Ele sofre um acidente de carro, cai de uma ponte e acorda numa praia, em outra cidade, com a memória apagada. Em Lawson, todos são simpáticos e as ruas exalam tranquilidade. Ao se deparar com Peter, Harry não titubeia: aquele é Luke, seu filho, um herói desaparecido da Segunda Guerra Mundial. Amnésico, o protagonista acredita na empolgação geral e é abraçado pelo povo.

Harry mora num apartamento localizado em cima de um cinema em ruínas chamado “The Majestic”. A comoção confunde Peter, que se sente mal por não conseguir responder às perguntas e não se lembrar de ninguém. O roteiro estabelece um paralelo interessante entre Peter e o cinema, já que, assim como sua mente, o local deixou de funcionar. Lawson é o oposto de Hollywood, em sua arquitetura, simplicidade, respeito às diferenças e afeto. As casas têm cercas pequenas e os interiores são acolhedores, repletos de porta-retratos que ressaltam, simultaneamente, a dor pela perda de entes queridos e o apego ao calor humano. Adele, namorada de Luke, retorna e o coloca em contato com a nova realidade. Peter não se recorda de nada, apenas dos filmes, que servem de ponte para interações mais elaboradas. O retorno de Luke é tão celebrado, que a cidade prepara uma festa para o protagonista.

A metade do rosto sombreado reflete a angústia por se desconhecer, o que muda com uma ideia brilhante: reformar o “The Majestic”. Quanto mais perto da inauguração, mais radiante e imerso àquela comunidade simpática Peter fica. Ele deixa de enxergar a estranheza; está apaixonado por Adele e trata Harry como o pai que nunca teve. A sessão de abertura não poderia ser mais certeira: “An American In Paris”, de Vincente Minnelli, é a definição de “alegria em movimento”. Os letreiros em neon e a predominância da cor vermelha são marcas da carta de amor de Frank Darabont ao cinema. O plano em que vemos o protagonista e Adele se beijando, em contraluz, atrás da tela, é belíssimo.

A polícia inicia uma investigação em busca do “comunista” e não demora muito a encontrá-lo. O roteiro, então, entra numa fase de decisões fundamentais. A primeira delas é fazer com que Peter recupere a memória ao assistir o filme que escreveu. A segunda, é garantir que Harry morra em paz, acreditando que passou os últimos meses da vida ao lado do filho. Darabont e sua equipe prestam homenagem a um período específico da sétima arte, no qual os finais esperançosos não eram melosos, mas belos. Seu desfecho é coerente com essa ideia e com o arco atravessado por Peter, que, ao recuperar sua identidade, percebe que sempre foi desprovido de personalidade própria. Ele era um homem da indústria, um peão em um jogo, muitas vezes, sujo e injusto. O povo de Lawson e os valores de Luke lhe apresentaram o caminho da verdade. Sem uma causa, o que somos? O que seria de Peter se ele simplesmente lesse uma declaração pedindo desculpas por algo que não fez (e que, se tivesse feito, também não poderia ser considerado um equívoco)?

De volta a Los Angeles, no tribunal, os flashes disparam como armas. Eu já estava cativado pela performance de Jim Carrey, que esbanja carisma e vulnerabilidade longe das habituais comédias; no entanto, foi neste momento que realmente fiquei admirado com seu desempenho. O ator demonstra tensão e dúvida palpáveis enquanto raciocina, deixando o espectador apreensivo.

Martin Landau é outro que oferece uma interpretação soberba, transmitindo emoções poderosas na medida certa. A coleção de coadjuvantes é encantadora.

“The Majestic” é um delicioso mergulho na década de 50. Um filme que foi injustamente criticado quando foi lançado. 

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